No séc. XVI, vivia em Cinco Vilas um homem de nome Bartolomeu, mais conhecido por Fidalgo das Cinco Vilas. Um dia conheceu D. Guiomar, senhora de uma importante família de Pinhel e resolveram casar, tendo escolhido o dia 8 de Dezembro, data natalícia dos dois noivos. Um ano depois, nasceu-lhe um filho que baptizaram com o nome de Luís.
Quando o pequenino fazia 7 anos, o pai resolveu partir para a Índia, em busca de fama e riqueza, incorporando-se na armada de D. Afonso de Albuquerque. Na grandiosa campanha, que o Vice-Rei desenvolveu em terras do Oriente, o Fidalgo de Cinco Vilas distinguiu-se em heroicidade, ao ponto de se tornar num dos principais fidalgos da comitiva de D. Afonso de Albuquerque.
Entretanto, D. Guiomar esmerava-se na educação do filho, arranjando-lhe os melhores mestres que o instruíram na arte de esgrimir, cavalgar e nas letras. Quando o pequeno Luís dominava sem dificuldade os ensinamentos ministrados, a mãe armou-o em cavaleiro, mas sentia-se triste por o marido não estar presente nesta altura tão importante na vida do filho.
A notícia de que Luís tinha sido armado cavaleiro, reavivou em D. Bartolomeu as saudades da família que o começavam a atormentar. Feitos os preparativos necessários, resolveu regressar a Portugal. Porém, na viagem, foi atacado pela febre, vindo a falecer sem ter a felicidade de ver os entes queridos pela última vez. A viúva, inconsolável, vestiu-se de luto pesado para toda a vida, dedicando-se por inteiro ao filho.
Entretanto, em Espanha fora decretada a expulsão dos Judeus. Muitos procuraram em Portugal o refúgio de que careciam, sendo Castelo Rodrigo uma das cinco regiões destinadas pelo nosso rei para se instalarem. Entre os muitos refugiados que a esta região acorreram, vinha um de nome Zacuto, muito rico, que comprou o alto da serra, a Poente de Castelo Rodrigo, e toda a encosta até ao rio Côa.
No cimo da serra, o judeu mandou construir uma casa onde passou a morar e, um pouco mais abaixo, uma vacaria, dedicando-se à produção de bezerros. Numa zona um pouco mais afastada, dedicou parte do terreno para o cultivo de forragens, cereais e outros géneros agrícolas, mandando reparar as oliveiras, plantar vinhas e instalar um grande rebanho de ovelhas e cabras. Zacuto era viúvo e vivia acompanhado pela única filha, Ofa, que fez herdeira de todos os bens adquiridos na terra que os acolhera. Por essa razão, começaram a chamar àquelas terras, a Serra da Moura Ofa.
A boa administração que Zacuto dedicava às terras e rebanhos, depressa lhe aumentou a fortuna. Luís, que vivia a escassos quilómetros do local, soube do acontecimento, e sentiu desejo de conhecer a bela judia, herdeira de tão avultada fortuna.
Quando se encontraram, os dois jovens sentiram-se de imediato atraídos um pelo outro, nascendo entre eles um desejo ardente de unirem as suas vidas. Quando o novo Fidalgo de Cinco Vilas contou à mãe a paixão que lhe incendiava o coração, a senhora sentiu-se muito triste, pois era grande a barreira que se levantava à realização do sonho do filho amado, uma vez que os dois jovens tinham religião diferente.
Pouco tempo depois, o rei de Portugal, D. Manuel I, ordenou a expulsão do Reino de todos os judeus que se não convertessem ao cristianismo. Para grande alegria de Luís, o velho judeu e a filha acataram a decisão real. O fidalgo correu para junto da mãe a contar-lhe a grande novidade. A senhora, autorizou-o a ir junto de Zacuto e pedir-lhe a mão de Ofa em casamento.
Sempre que a mãe ou os amigos lhe perguntavam onde ia, o Fidalgo de Cinco Vilas, enchia o peito de alegria e respondia: “vou a amar Ofa“, ou ”Vou ver o meu amor Ofa“.
Algum tempo depois, a 8 de Dezembro, o enlace matrimonial teve lugar no Mosteiro de Santa Maria de Aguiar. Deste casamento nasceram muitos filhos que se tornaram herdeiros de muitas terras daquém e além Côa.
Diz a tradição que a serra passou a ser conhecida por serra da Marofa na inocente imitação da resposta do Luís, quando dizia que “ia amar Ofa“.
Nas montanhas do nordeste de Portugal, região de extensos olivais, onde no início da primavera (Fevereiro e Março) florescem amendoeiras e no outono (Setembro e Outubro) as vinhas se cobrem de folhas cor de fogo, corre para o rio Douro um afluente cujo nome se tornou universal. Milénio após milénio, as rochas de xisto que delimitam o leito do Côa foram-se convertendo em painéis de arte, com milhares de gravuras legadas pelo impulso criador dos nossos antepassados.
Remontando ao Paleolítico Superior, estes painéis ao ar livre e os habitat identificados são testemunhos da vitalidade e mestria que trouxeram até nós 25.000 anos de arte. Esta extensa galeria de arte oferece-nos também registos do período Neolítico e da Idade do Ferro, transpondo depois de um só fôlego dois mil anos de História para firmar na Época Moderna representações religiosas, nomes e datas, para além da arte ingénua dos moleiros nos anos quarenta e cinquenta do século passado.
Há muito conhecidas pelas pessoas da região, sobretudo os pastores ou os moleiros que trabalhavam nas margens do rio na zona da Canada do Inferno, as gravuras do Vale do Côa, foram identificadas pela primeira vez em 1991, pelo arqueólogo Nelson Rebanda, que acompanhava a construção da barragem do Côa. Tornada pública em 1994, a descoberta provocou grande discussão pois a construção da barragem provocaria a submersão daquela área.
Tendo em conta a opinião dos especialistas acerca da importância artística e científica das gravuras do Côa, o governo português decide abandonar a construção da barragem em 1996. Foi então criado o Parque Arqueológico do Vale do Côa, a fim de proteger e divulgar a riqueza artística e arqueológica do local.
Em 1998, a UNESCO classificou os núcleos de gravuras rupestres como Património Mundial, dando a conhecer ao Mundo este tesouro da Humanidade, em território português. As gravuras rupestres do Côa vieram mudar o paradigma da mais antiga expressão artística da Humanidade que, até então, se pensava estar circunscrita a grutas subterrâneas. Depois da sua identificação, em meados da última década do século XX, colocou-se a hipótese de a arte rupestre ao ar livre ter sido mais comum. Só que, devido aos diversos agentes erosivos naturais e a própria atividade humana ao longo dos milénios, os seus vestígios terão sido apagados. Daí a preservação dos sítios arqueológicos do Vale do Côa ser tão importante.
Apesar de existirem mais de 80 sítios com arte rupestre, distribuídos numa extensão de cerca de 30 kms na margem do rio Côa e cerca de 15 kms ao longo do rio Douro, estão abertos ao público apenas três núcleos de gravuras: Canada do Inferno (o primeiro local a ser identificado), Penascosa e Ribeira de Priscos.A grande maioria dos motivos rupestres localiza-se em rochas de xisto, mas também podemos encontrar gravuras e pinturas sobre granito. As técnicas utilizadas para a gravação eram comuns na altura, semelhantes a técnicas identificadas em gravuras encontradas em Espanha e França, como a incisão filiforme, picotagem, abrasão e raspagem. Quanto às temáticas representadas, os animais são as figuras mais comuns – cavalos, vacas, cabras e veados -, representados isolados ou em grupo.