A Rocha dos Namorados (ou Pedra dos Namorados) pode ser encontrada à entrada da aldeia oleira de São Pedro do Corval, para quem vem do sempre encantador Castelo de Monsaraz e do igualmente famoso Cromeleque do Xarez.
A Pedra dos Namorados
É um calhau que faz dois de nós em altura, e um de nós em largura, de material granítico, pedra que até associamos mais ao norte do que ao sul.
Achatada em cima, com uma forma que se vai alargando à medida que cresce, há quem a associe a um cogumelo.
Trata-se de uma fragmento rochoso que vai para além disso. É uma rocha evocativa, ligada a rituais pagãos e que ainda hoje funciona como força espiritual para a população local.
A igreja meteu-lhe o seu carimbo, picando uma cruz de Cristo nas suas costas – se o povo, instintivamente pagão, não abandona os seus símbolos naturais, então que se tornem os símbolos naturais mais eclesiais. Não bastou isso e os párocos cá da freguesia fizeram ainda questão de que as procissões da zona aqui passassem, dando mais uma camada de cristianismo a este monumento popular.
Os ritos fecundos
Mas nada disso consegue disfarçar o essencial da Rocha dos Namorados. O seu nome, aliás, não pode ser mais sugestivo, e daqui conseguimos pressupor que está ligada a fenómenos de celebração da fecundidade.
Indo ao que mais importa, esta pedra está apinhada de pequenos calhaus na sua cúpula – e podemos testemunhá-lo lá indo. Obviamente, o fenómeno tem razão de ser. É que, na altura dos festejos da Ressurreição de Cristo, aqui vêm mulheres jovens, na transição para a idade adulta, atirar pequenas pedras para cima deste rochedo, sendo o objectivo que estas se quedem lá em cima e por lá fiquem – a cada pedra falhada, aumenta-lhes um ano de espera até ao dia do seu casamento. O lançamento deve ser feito de costas, aumentando a dificuldade (e a espera).
A Ressurreição de Cristo, sabemos, é uma época carregada de simbolismo: estamos, na verdade, perante uma outra ressurreição, a da terra, que depois de morrer nos meses de Inverno volta à vida no alvor da Primavera, e que por esta altura torna a abrir e a dar à luz os seus frutos e flores. O retorno à vida de Jesus funciona assim como uma metáfora para um outro retorno à vida, o da natureza, que rejuvenesce. A Rocha dos Namorados e as solteiras que lá vão sortear o seu futuro inserem-se, portanto, neste contexto. Estamos perante uma homenagem à mãe-terra feita numa retórica diferente, mas de cariz popular, porque nasce do povo e este é o ponto de partida para o Sagrado.
Brites de Almeida, a Padeira de Aljubarrota, foi uma figura lendária e heroína portuguesa, cujo nome anda associado à vitória dos portugueses, contra as forças castelhanas, na batalha de Aljubarrota (1385). Com a sua pá de padeira, teria morto sete castelhanos que encontrara escondidos num forno.
Brites de Almeida teria nascido em Faro, em 1350, de pais pobres e de condição humilde, donos de uma pequena taberna.
A lenda conta que desde pequena, Brites se revelou uma mulher corpulenta, ossuda e feia, de nariz adunco, boca muito rasgada e cabelos crespos.Teria seis dedos nas mãos, o que teria alegrado os pais, pois julgaram ter em casa uma futura mulher muito trabalhadora. Contudo, isso não teria sucedido, sendo que Brites teria amargurado a vida dos seus progenitores, que faleceriam precocemente.
Aos 26 anos ela estaria já órfã, facto que se diz não a ter afligido muito. Vendeu os parcos haveres que possuía, resolvendo levar uma vida errante, negociando de feira em feira. Muitas são as aventuras que supostamente viveu, da morte de um pretendente no fio da sua própria espada, até à fuga para Espanha a bordo de um batel assaltado por piratas que a venderam como escrava a um senhor poderoso da Mauritânia.
Acabaria, entre uma lendária vida pouco virtuosa e confusa, por se fixar em Aljubarrota, onde se tornaria dona de uma padaria e tomaria um rumo mais honesto de vida. Encontrar-se-ia nesta vila quando se deu a batalha entre portugueses e castelhanos.
Derrotados os castelhanos, sete deles fugiram do campo da batalha para se albergarem nas redondezas. Encontraram abrigo na casa de Brites, que estava vazia porque Brites teria saído para ajudar nas escaramuças que ocorriam. Quando Brites voltou, tendo encontrado a porta fechada, logo desconfiou da presença de inimigos e entrou alvoroçada à procura de castelhanos. Teria encontrado os sete homens dentro do seu forno, escondidos. Intimando-os a sair e a renderem-se, e vendo que eles não respondiam pois fingiam dormir ou não entender, bateu-lhes com a sua pá, matando-os.
Diz-se também que, depois do sucedido, Brites teria reunido um grupo de mulheres e constituído uma espécie de milícia que perseguia os inimigos, matando-os sem dó nem piedade.
No séc. XVI, vivia em Cinco Vilas um homem de nome Bartolomeu, mais conhecido por Fidalgo das Cinco Vilas. Um dia conheceu D. Guiomar, senhora de uma importante família de Pinhel e resolveram casar, tendo escolhido o dia 8 de Dezembro, data natalícia dos dois noivos. Um ano depois, nasceu-lhe um filho que baptizaram com o nome de Luís.
Quando o pequenino fazia 7 anos, o pai resolveu partir para a Índia, em busca de fama e riqueza, incorporando-se na armada de D. Afonso de Albuquerque. Na grandiosa campanha, que o Vice-Rei desenvolveu em terras do Oriente, o Fidalgo de Cinco Vilas distinguiu-se em heroicidade, ao ponto de se tornar num dos principais fidalgos da comitiva de D. Afonso de Albuquerque.
Entretanto, D. Guiomar esmerava-se na educação do filho, arranjando-lhe os melhores mestres que o instruíram na arte de esgrimir, cavalgar e nas letras. Quando o pequeno Luís dominava sem dificuldade os ensinamentos ministrados, a mãe armou-o em cavaleiro, mas sentia-se triste por o marido não estar presente nesta altura tão importante na vida do filho.
A notícia de que Luís tinha sido armado cavaleiro, reavivou em D. Bartolomeu as saudades da família que o começavam a atormentar. Feitos os preparativos necessários, resolveu regressar a Portugal. Porém, na viagem, foi atacado pela febre, vindo a falecer sem ter a felicidade de ver os entes queridos pela última vez. A viúva, inconsolável, vestiu-se de luto pesado para toda a vida, dedicando-se por inteiro ao filho.
Entretanto, em Espanha fora decretada a expulsão dos Judeus. Muitos procuraram em Portugal o refúgio de que careciam, sendo Castelo Rodrigo uma das cinco regiões destinadas pelo nosso rei para se instalarem. Entre os muitos refugiados que a esta região acorreram, vinha um de nome Zacuto, muito rico, que comprou o alto da serra, a Poente de Castelo Rodrigo, e toda a encosta até ao rio Côa.
No cimo da serra, o judeu mandou construir uma casa onde passou a morar e, um pouco mais abaixo, uma vacaria, dedicando-se à produção de bezerros. Numa zona um pouco mais afastada, dedicou parte do terreno para o cultivo de forragens, cereais e outros géneros agrícolas, mandando reparar as oliveiras, plantar vinhas e instalar um grande rebanho de ovelhas e cabras. Zacuto era viúvo e vivia acompanhado pela única filha, Ofa, que fez herdeira de todos os bens adquiridos na terra que os acolhera. Por essa razão, começaram a chamar àquelas terras, a Serra da Moura Ofa.
A boa administração que Zacuto dedicava às terras e rebanhos, depressa lhe aumentou a fortuna. Luís, que vivia a escassos quilómetros do local, soube do acontecimento, e sentiu desejo de conhecer a bela judia, herdeira de tão avultada fortuna.
Quando se encontraram, os dois jovens sentiram-se de imediato atraídos um pelo outro, nascendo entre eles um desejo ardente de unirem as suas vidas. Quando o novo Fidalgo de Cinco Vilas contou à mãe a paixão que lhe incendiava o coração, a senhora sentiu-se muito triste, pois era grande a barreira que se levantava à realização do sonho do filho amado, uma vez que os dois jovens tinham religião diferente.
Pouco tempo depois, o rei de Portugal, D. Manuel I, ordenou a expulsão do Reino de todos os judeus que se não convertessem ao cristianismo. Para grande alegria de Luís, o velho judeu e a filha acataram a decisão real. O fidalgo correu para junto da mãe a contar-lhe a grande novidade. A senhora, autorizou-o a ir junto de Zacuto e pedir-lhe a mão de Ofa em casamento.
Sempre que a mãe ou os amigos lhe perguntavam onde ia, o Fidalgo de Cinco Vilas, enchia o peito de alegria e respondia: “vou a amar Ofa“, ou ”Vou ver o meu amor Ofa“.
Algum tempo depois, a 8 de Dezembro, o enlace matrimonial teve lugar no Mosteiro de Santa Maria de Aguiar. Deste casamento nasceram muitos filhos que se tornaram herdeiros de muitas terras daquém e além Côa.
Diz a tradição que a serra passou a ser conhecida por serra da Marofa na inocente imitação da resposta do Luís, quando dizia que “ia amar Ofa“.
Quando pensamos na Inglaterra, quase direitamente pensamos ao chá.
Chá é algo tão inglês, uma parte tão enraizada de sua cultura, que é também enraizada a ideia de que todos no mundo conhecem essa cultura.
E por mais que faça parte do senso comum a noção de que os ocidentais devem agradecer à China pelo cultivo da bebida, é muito menos conhecida a história que inspirou a sua popularidade na Inglaterra: uma mulher portuguesa.
Em1662, numa monarquia britânica recém-restaurada, Catarina de Bragança (filha do rei português João IV) foi prometida ao rei inglês Charles II com a ajuda de um enorme dote que incluía dinheiro, temperos, tesouros e os portos lucrativos de Tânger e Mumbai.
Esse contrato a transformou numa mulher muito importante: a rainha da Inglaterra, Escócia e Irlanda.
Quando Catarina tomou viajou para o norte para se unir a Charles II, reza a lenda que ela tinha na bagagem folhas de chá – e que possivelmente também faziam parte do dote.
Uma divertida anedota diz que, na caixa, estava escrito Transporte de Ervas Aromáticas, palavras que foram abreviadas para T.E.A (chá é “tea” em inglês).
Essa última parte provavelmente não é verdade – etimologistas acreditam que a palavra “chá” vem da transliteração de um caractere chinês -, mas o que se sabe com certeza é que o chá já era popular entre a aristocracia portuguesa devido à rota comercial do país para a China através de sua colônia em Macau, estabelecida por volta de 1500.
Quando a nova rainha chegou à Inglaterra, o chá era consumido apenas como remédio. Acreditava-se que ele dava vigor ao corpo
Mas, acostumada a beber o chá como parte de sua rotina diária, a jovem rainha sem dúvida manteve o seu hábito, tornando-o popular como uma bebida social em vez de apenas um tonificante.
O seu hábito de beber chá influenciou outros a fazê-lo. As mulheres da corte se apressaram a copiá-la para tentar fazer parte de seu círculo”.
Edmund Waller, um poeta popular na época, até escreveu uma ode de aniversário para a rainha logo após sua chegada:
”A melhor das rainhas e a melhor das ervas, nós devemos
Àquela importante nação, pela forma como eles mostraram
À justa região onde o sol se põe,
Cujas ricas produções nós valorizamos justamente”.
Na verdade, o chá poderia ser encontrado na Inglaterra antes da chegada de Catarina, mas não era muito popular.
O chá era algo pouco comum para a época porque o produto era caro e todos bebiam café nessa época.
A razão para o alto custo tinha três motivos: a Inglaterra não tinha comércio direto com a China, o chá da Índia ainda não estava disponível e as quantidades pequenas importadas pelos holandeses com alta margem de lucro.
Nos principio eles copiaram o ritual inteiro da China. O país de origem de Catarina também teve um papel na popularização desse aspecto da experiência do chá. Portugal era uma das rotas através das quais a porcelana chegava até a Europa. A porcelana provavelmente também fez parte do dote de Catarina e, assim como outras mulheres aristocratas, ela teria acumulado muitos ornamentos para suas sessões de chá ao viver na Inglaterra
Ela deu início a um hábito aristocrático nos seus palácios – muito elegante, muito classe alta, e então todas as cerimônias que chegavam da China eram imediatamente associadas com o alto estilo de vida.
Mas o chá não foi a unica introdução de Catarina de Bragança na Inglaterra.
-O conhecimento da laranja
Catarina adorava laranjas e nunca deixou de as comer graças aos cestos delas que a mãe lhe enviava.
-A compota de laranja
Que os ingleses chamam de “marmelade”, usando, erradamente, o termo português marmelada, porque a marmelada portuguesa já tinha sido introduzida na Inglaterra em 1495.
Catarina guardava a compota de laranjas normais para si e suas amigas e a de laranjas amargas para as inimigas, principalmente, para as amantes do rei.
-Influenciou o modo de vestir
Introduziu a saia curta. Naquele tempo, saia curta era acima do tornozelo e Catarina escandalizou a corte inglesa por mostrar os pés
-Introduziu o hábito de vestir roupa masculina para montar.
-O uso do garfo para comer
Na Inglaterra, mesmo na corte, comiam com as mãos, embora o garfo já fosse conhecido, mas só para trinchar ou servir. Catarina estava habituada a usá-lo para comer e, em breve, todos faziam o mesmo.
-Introdução da porcelana
Estranhou comerem em pratos de ouro ou de prata e perguntou porque não comiam em pratos de porcelana como se fazia, já há muitos anos, em Portugal. A partir de aí, o uso de louça de porcelana generalizou-se.
-Música
Do séquito que levou de Portugal fazia parte uma orquestra de músicos portugueses e foi por sua mão que se ouviu a primeira ópera em Inglaterra.
-Mobiliário
Catarina também levou consigo alguns móveis, entre os quais preciosos contadores indo-portugueses que nunca tinham sido vistos em Inglaterra.
-O nascimento do “Império Britânico”
O dote de Catarina foi grandioso pela quantia em dinheiro mas, muito mais importante para o futuro, por incluir a cidade de Tânger, no Norte de África e a ilha de Bombaim, na Índia. Traindo os Tratados que tinham assumido e com a desculpa de que o rei de Portugal era espanhol, os ingleses conseguiram, apesar do controle da Marinha Portuguesa, navegar até à Índia onde criaram um entreposto em Gujarate. Em 1670, depois de receber Bombaim dos portugueses, o rei Carlos II autorizou a Companhia das Índias Orientais a adquirir territórios.
Nasceu, assim, o Império Britânico!
– A sua popularidade estendeu-se até à América, onde um dos cinco bairros de Nova Iorque (Queens) foi baptizado em sua homenagem.
Dentro de poucos dias será Natal e uma tradição que muitas famílias respeitam é aquela do arvore de Natal. Mas como nasceu esta tradição? E como chegou em Portugal?
No passado, a Igreja Católica não celebrava o Natal, embora celebrasse o nascimento de Jesus
Foi no século VI com o Papa Júlio I que fixou-se a data do nascimento de Jesus para o dia 25 de dezembro, e começamos a celebrar esta festa.
Muito antes, para os romanos, era o dia da Saturnália, festas dedicadas ao deus Saturno e ao solstício de Inverno celebrado pelos celtas e pelos povos germânicos. Foi assim que uma antiga festa pagã transformou-se na maior festa cristã.
Mas falamos da arvore de Natal, que em Portugal, junto ao presépio, não pode faltar.
Esta tradição é quase obrigatória em todas as casas e é preparada normalmente entre o 1 e o 8 de dezembro.
Na realidade a tradição já existia ao tempo dos romanos que preparavam abetos para as Saturnais.
As primeiras árvores de Natal eram decoradas com papel, frutas secas e bolos
Segundo a historia, a arvore deve ser um pinheiro pela sua forma triangular que representa para os cristãos a Trindade. A primeira referência à árvore de Natal é em 1510, na Lituânia, atribuída a Lutero que teria decorado uma árvore com velas e uma estrela.
E no século XVI, essa tradição jà presente em Alemanha e da Alemanha passou para toda a Europa e chegou em Portugal no século XIX.
Em 1835, como D. Maria II enviuvou meses depois do seu primeiro casamento com o príncipe Augusto de Beauharnais, foi escolhido para novo esposo da soberana D Fernando de Saxe Coburgo Gotha.
D Fernando II e D Maria II tiveram um casamento feliz coroado par 11 filhos ( a rainha faleceu no dar a luz ao ultimo filho). Ele introduziu o romantismo em Portugal, é conhecido pelo seu gosto para a literatura e a arte e pela construção do palácio da Pena em Sintra. Mas foi ele também que introduziu a arvore de Natal em Portugal.
Em 1844 decidiu surpreender a sua família e preparou uma árvore de Natal decorada com bolas colorada e bolos e presentes ao lado da arvore. A partir de là a tradição da arvore foi introduzida em Portugal.
Uma curiosidade: Cada Natal, D Fernando dava os presentes aos seus filhos vestido de São Nicolau. O seu primo, Albert (marido da Rainha Vitória na Inglaterra) fazia exactamente o mesmo para a sua família em Inglaterra .
Em Portugal, existem dois santos casamenteiros. Um com o seu trono em Lisboa que é Santo António, e outro situado a norte, S. Gonçalo de Amarante. Para não haver concorrência desleal entre os dois, Santo António encarrega-se das mais novas, enquanto S. Gonçalo trata das “velhas”. É esta a crença popular, mas não é só por esse motivo que a igreja de São Gonçalo é local de paragem obrigatória.
S. Gonçalo tem honras de Padroeiro de Amarante e a sua memória é festejada em duas ocasiões no ano: a 10 de janeiro data do seu falecimento e no primeiro fim de semana de junho, com as grandiosas festas da cidade.
Oriundo da nobre família dos Pereira, Gonçalo nasceu no Paço de Arriconha, por volta de 1187 e herda de seus pais a nobreza no sangue e a grandeza na Fé.
É educado nos bons princípios cristãos e, quando atinge a mocidade, opta pela vida eclesiástica, estudando as primeiras letras, crê-se, no mosteiro beneditino de Santa Maria de Pombeiro de Ribavizela, prosseguido estudos no Paço Arcebispal de Braga, onde viria a ser ordenado sacerdote. Não satisfeito com a vida paroquial e ardendo no desejo de conhecer os lugares mais Santos do Cristianismo, decide encetar uma longa peregrinação a Roma, para estar junto dos túmulos dos Apóstolos Pedro e Paulo, seguindo, depois, para a Palestina.
Após catorze anos, Gonçalo regressa à sua paróquia de S. Paio de Vizela que, durante a sua ausência, fora dirigida por um sobrinho que, o não reconhecendo, o expulsa de casa. Desiludido com a vida opulenta e faustosa do seu substituto e deparando-se com o desrespeito aos ensinamentos e à humildade cristã, decide abandonar a vida paroquial e opta por um modus vivendi mais contemplativo, eremítico e evangelizador. Toma o hábito da Ordem de S. Domingos.
Foi através desta nova forma de vida que chegou ao vale do Tâmega. Deparando-se com uma ermida arruinada dedicada a Nossa Senhora da Assunção, localizada num local ermo, junto ao rio e nas imediações de uma ponte devoluta, aí se instala e recupera o velho templo.
Calcorreando as povoações do vale do Tâmega e da Serra do Marão, Frei Gonçalo, evangeliza e abençoa uniões matrimoniais, apoia e protege os mais desfavorecidos e realiza alguns prodígios, que lhe vão conferindo aura de santidade. No decorrer destas ações pastorais, depara-se com as dificuldades e com o perigo que os seus fiéis corriam ao aventurarem-se a atravessar o rio, principalmente nas alturas em que este se apresentava mais caudaloso e, na falta de alternativas, decide empreender, ele próprio, o restauro ou a reedificação da velha ponte romana, nos idos de 1250.
Para a sua reconstrução terá contado com a participação de todos, desde os mais abastados que contribuíram com alguns numerários e matéria-prima e os mais pobres que, com o seu esforço, executaram a obra. Consta que o arquiteto fora o próprio santo. A ponte medieval haveria de perdurar até ao dia 10 de fevereiro de 1763, altura em que sucumbe face à turbulência das águas do Tâmega, durante uma cheia, desmoronando-se por completo, tendo apenas sobrevivido o cruzeiro biface de Nossa Senhora da Ponte.
Após a construção da ponte e do restabelecimento do tráfego, o frade dominicano continuou com a sua vida de pregador até ao dia da sua morte, ocorrida a 10 de janeiro de 1259.
A partir de então, muitos foram aqueles que acorreram ao seu túmulo, instalado na mesma ermida onde residiu para, junto aos seus restos mortais, pedirem ou agradecerem a sua intercessão.
Em 1540, D. João III manda construir, no lugar da velha ermida medieval, um convento que entrega aos frades pregadores de S. Domingos, Ordem à qual o Santo estava vinculado.
No dia 16 de setembro de 1561, Gonçalo de Amarante é beatificado pelo papa Pio IV e, algum tempo depois, já no reinado de D. Filipe I de Portugal (II de Espanha), inicia-se o seu processo de canonização, que acaba por ficar sem efeito.
O Papa Clemente X, em 1671, estende o ofício da sua festa litúrgica a toda a Ordem Dominicana, que é celebrada no dia do seu falecimento, a 10 de Janeiro.
Daí para cá o seu culto jamais parou de se difundir e propagar em Portugal e nos países lusófonos, destacando-se o Brasil, onde várias localidades o têm por padroeiro.
São Gonçalo então não é santo. Para a Igreja Católica é considerado beato, Beato Gonçalo de Amarante. Mas para a população é santo e a devoção por ele não é menor, seja qual for a denominação utilizada. O seu túmulo, onde se acredita estar o seu corpo sepultado, pode ser visitado na capela-mor do mosteiro.
São Gonçalo é considerado o “casamenteiro das velhas”, o que parece não agradar às mais jovens que não querem esperar, e terá sido por isso que nasceu a famosa quadra popular de Amarante:
S. Gonçalo de Amarante,
Casamenteiro das velhas,
Porque não casas as novas?
Que mal te fizeram elas?
Na igreja, ainda existe a estátua de São Gonçalo, do século XVI, em que existe a famosa corda de São Gonçalo. A corda rodeia a cintura da estátua e, segundo crença popular, “as encalhadas” deveriam puxar a corda três vezes, para pedir um casamento ao santo.
Em conclusão se ja passaste a idade para pedir a ajuda a Santo Antonio, aqui tens a oração de casamento para São Gonçalo:
“São Gonçalo do Amarante, Casamenteiro que sois, Primeiro casais a mim; As outras casais depois.
São Gonçalo ajudai-me, De joelhos lhe imploro, Fazei com que eu case logo, Com aquele que adoro.”
Uma curiosidade:
São Gonçalo de Amarante está enraizado na cultura da Princesa do Tâmega, com doces peculiares com formas fálicas, com quadras picantes que e com uma história rica de conquistas e actos heróicos importantes na construção da história de Portugal. Segundo a lenda popular, São Gonçalo é casamenteiro e é, por isso, que durante as festas são vendidos e apreciados “os doces fálicos” de S. Gonçalo, de todos os tamanhos e feitios.
O meu artigo de hoje nasce do livro “A rainha adultera” de Marsilio Cassoti, onde pela primeira vez fala-se da teoria de uma inseminação assistida realizada pela infanta D Joana de Portugal, no século XV, que deu origem ao nascimento de D Juana de Castela, considerada, pela epoca em que nasceu, fruto de uma relação adultera.
D. Joana de Avis (1439 -1475), infanta de Portugal, foi rainha de Castela enquanto esposa do rei Enrique IV de Castela. Apesar deste último ter recebido o cognome de “o Impotente”, o casal régio teve descendência legítima na pessoa de D. Juana de Castela.
O problema que causava a impotência a Henrique IV está bem documentado por descrições de exames urológicos feitos em vida do monarca e por análises aos seus restos mortais efectuadas também no século XX.
O rei de Castela não conseguia consumar o acto sexual por um constrangimento físico na anatomia funcional do seu órgão genital.
Mas a necessidade de assegurar descendência legítima, levou a que medidas “excepcionais” fossem tomadas.
Havia uma indicação anterior inscrita na “Lei de Partidas” de Alfonso X de Castela, o Sábio, que autorizava a praticar nos reis de Castela “as mestrias que se façam” para resolver os seus problemas reprodutivos, mas sempre no respeito pelo direito natural tal como proclamado pela Igreja Católica.
E quais seriam essas “mestrias”? Enrique IV recorreu à “concepção sem cópula” para engravidar D. Joana de Portugal. Para isto fez chamar um físico (médico) judeu, especialista que terá efectuado essa “mestria” no casal monarca. Estas práticas eram proibidas pela Igreja Católica, mas não pela lei judaica.
Como descobrimos no livro de Cassoti, está bem documentada o reconhecimento da concepção sem cópula como sendo possível e legítima “pelos sábios judeus da antiguidade, a primeira vez no século V d. C., no Talmud da Babilónia” e existem referências precisas a este tema “nas obras de rabinos judeus dos séculos XIII e XIV da área mediterrânica”.
Nesta biografia de D. Joana de Portugal, o historiador apresenta, facto após facto, argumento após argumento, a tese de que D. Joana de Portugal terá sido inseminada artificialmente, ou pelo menos de forma assistida, com sémen de Enrique IV de Castela, através de uma “mestria” conduzida provavelmente pelo físico judeu de nome Yusef bem Yahia.
A inseminação decorreu com sucesso, e a 28 de Fevereiro de 1462 nasceria D. Juana de Castela, legitimada pelo Papa Pio II como descendente de Enrique IV de Castela.
De facto, D. Joana foi afastada da corte e repudiada por Enrique IV de Castela pelas suas relações extraconjugais.
O passo seguinte seria a análise genética comparada de D. Juana e Enrique IV, a partir dos seus restos mortais, para confirmar que a primeira é filha biológica do monarca.
Infelizmente, ambos os restos mortais de mãe e filha desapareceram em infortunas demolições dos edifícios em que estavam sepultadas, não permitindo uma analise que poderia esclarecer ainda mais essa interessante teoria.
Há quem diga que atirou 70 pessoas do Aqueduto das Águas Livres, que a bebida e o vício o levaram a cometer assaltos grotescos ou que era simplesmente louco. De qualquer das formas, o “Pancada” ficou para a história como um dos maiores criminosos de Lisboa do século XIX.
Diogo Alves nasceu na Galícia, na Espanha, em 1810. Algum tempo depois, foi tentar a vida em Lisboa, onde passou a cometer crimes, ninguém sabe por qual motivo. Historiadores dizem que ele era analfabeto e rude.
O “Pancada”, um dos apelidos atribuídos a Diogo Alves, começou como criado, mas chegou à posição de servente, tratando de cavalos em várias casas senhoriais e ganhando a confiança dos seus patrões, que chegaram a emprestar-lhe largas quantias de dinheiro. A sua companheira Gertrudes Maria, a “Parreirinha”, com a ajuda do jogo, das apostas em corridas de cavalo e o álcool, encaminhou o “Pancada” por caminhos menos nobres.
Em 1836, Diogo começou a matar. O seu lugar de ação era o Aqueduto das Águas Livres, um sistema de captação e transporte de água construído no século 18 e que tem 58 km de extensão – com o ponto mais alto de 65 m de altura. As vítimas eram viajantes, comerciantes e estudantes que usavam um caminho estreito no alto do aqueduto como atalho para o centro de Lisboa
Diogo surpreendia as vítimas, roubava as seus pertences e as matava, atirando-as do alto do aqueduto. Como eram pessoas pobres, a polícia não se esforçava para investigar, e as mortes geralmente eram tratadas como suicídios.
Acredita-se que Diogo Alves atirava os indivíduos que assaltava das galerias do Aqueduto das Águas Livres, para que não pudessem denunciá-lo. O número de vítimas é incerto, uma vez que se associaram estes repetidos acontecimentos a uma vaga de suicídios; no entanto, pensa-se que ultrapassaram as 70 mortes. O aqueduto depois de tantos crimes por resolver, ficou fechado ao trânsito de pessoas, em 1837 e durante várias décadas. Foi por isso que, a partir de então, o galego não matou mais ninguém no aqueduto. Ajudado pela sua “quadrilha” continuou a roubar e a matar pessoas, como o massacre cometido na família de um conhecido médico da época Pedro de Andrade. O suspeito foi entregue às autoridades, três anos depois, por alguém do seu próprio grupo e nunca foi aberta uma investigação contra ele pelas mortes no vale de Alcântara.
Alves foi condenado à morte pelo massacre da família do médico e decapitado em fevereiro de 1841, no Cais do Tojo de Lisboa, sendo um dos últimos a quem se aplicou a pena de morte em Portugal.
Depois de ser enforcado, a cabeça do criminoso foi entregue a prestigiosos médicos da época, da Escola Médico-Cirúrgica. Os investigadores queriam estudar o que se escondia por detrás daquela frieza e crueldade. A cabeça de Diogo Alves, conservou-se em perfeito estado, graças ao formol.
A cabeça foi conservada na Faculdade de Medicina de Lisboa.
Em 1514, Afonso de Albuquerque, fundador do Império Português no Oriente e governador das Índias Portuguesas, quis construir uma fortaleza em Diu, cidade situada no reino de Cambaia, governado pelo rei Modofar. Afonso de Albuquerque foi autorizado pelo rei D. Manuel I, a enviar uma embaixada ao rei de Cambaia, solicitando autorização para construir a fortaleza. O rei Modofar não cedeu ao pedido mas, apreciando as oferendas recebidas, deu a Afonso de Albuquerque um rinoceronte. Como era impossível mantê-lo em Goa, Afonso de Albuquerque decidiu enviar o rinoceronte ao rei D. Manuel I, como presente.
A chegada do animal a Lisboa causou muita curiosidade, não só em Portugal como no resto da Europa sobretudo pelo seu aspeto – o rinoceronte pesava mais de duas toneladas e tinha uma pele espessa e rugosa formando três grandes pregas que lhe davam a estranha aparência de uma armadura. Era o primeiro rinoceronte vivo em solo europeu desde o séc. III.
O rinoceronte, que foi chamado Ganda, ficou instalado no parque do Palácio da Ribeira. Lembrando ao rei as histórias romanas sobre o ódio mortal entre elefantes e rinocerontes, D. Manuel I, que tinha como animal de estimação um pequeno elefante, decidiu verificar se tal historia era verdade. Assim, foi organizado um combate entre os dois animais, a que assistiram o rei, a rainha e as suas damas de companhia, bem como muitos outros convidados importantes. O evento foi organizado no terreiro do paço, hoje-em-dia praça do commercio e foram montados palcos para assistir a este espectáculo.
Quando os dois animais se encontraram frente a frente, o elefante, que parecia ser o mais nervoso, entrou em pânico e fugiu mal o rinoceronte se começou a aproximar, destruindo os palcos e difundindo o panico entre as pessoas.
Em 1515, o rei D. Manuel I decidiu organizar uma nova embaixada extraordinária a Roma, para garantir o apoio do Papa, na sequência dos crescentes sucessos dos navegadores portugueses no Oriente, e com vista a consolidar o prestígio internacional do reino. Entre as ofertas decidiu enviar o rinoceronte, que usava uma coleira em veludo verde com rosas e cravos dourados. A nau partiu de Lisboa em Dezembro de 1515.
Ao largo de Génova surgiu uma violenta tempestade, tendo o navio afundado, perecendo toda a tripulação. O rinoceronte, embora soubesse nadar, acabou por se afogar, por causa das amarras. No entanto, foi possível recuperar o seu corpo. Ao saber da notícia, D. Manuel I ordenou que o rinoceronte fosse empalhado e enviado ao Papa, como se nada tivesse acontecido. Mas este animal não fez tanto sucesso junto do Papa como anteriormente tinha feito o elefante!
Em Portugal o rinoceronte foi imortalizado, encontrando-se representado no Mosteiro de Alcobaça, onde existe uma representação naturalista do animal de corpo inteiro, com função de gárgula, no Claustro do Silêncio. Foi também desenhado pelo grande mestre impressor Albrecht Dürer, baseando-se numa carta de um mercador português que continha um desenho do rinoceronte.
E um pequeno rinoceronte está também imortalizado na torre de Belém. Onde? Vens comigo visitá-la e iremos descobrir-lo.
A Igreja de São Domingos, uma igreja barroca situada no centro histórico de Lisboa, junto à Praça do Rossio, data do século XIII e, além de ter sido uma igreja importante pois aqui celebravam-se os casamentos reais, é também protagonista de uma historia que ainda hoje nos faz arrepiar.
A primeira pedra da Igreja de São Domingos foi lançada no ano de 1241 sendo que, desde então, esta tem sofrido sucessivas campanhas de restauro e ampliação.
O estilo arquitetónico da Igreja de São Domingos é uma mescla dos diferentes períodos e influências que a moldaram, entre as quais em 1748, com a reforma implementada por Frederico Ludovice à capela-mor, assim como a posterior obra de reconstrução de Manuel Caetano Sousa e as obras de reconstrução que se deram após o grande incêndio de 1959. Dos vários elementos que a constituem sobressaem os Maneiristas e Barrocos.
Esta igreja barroca encontra-se classificada como Monumento Nacional. Contém traços maneiristas, de nave única em cruz latina, transepto saliente, capela-mor rectangular, cripta circular, claustro e sacristia. O exterior caracteriza-se pela simplicidade de linhas e o interior é rico e eclético, destacando-se as suas colunas de grandes dimensões, os mármores e azulejos.
Mas é uma historia que aqui aconteceu a mais de 500 anos que marcou a história desta igreja para sempre.
Foi na Igreja de São Domingos que começou um dos episódios mais negros da história de Lisboa: o massacre dos judeus da cidade, em 1506.
O dia 19 de Abril de 1506 os fiéis enchiam a igreja, pedindo o fim da seca e da peste, quando uma luz entrou na igreja e alguém disse ter visto o rosto de Cristo iluminado. Logo todos começaram a gritar que era um milagre. Houve, no meio disto, uma voz discordante: um cristão-novo, ou seja, um judeu que fora obrigado a converter-se, tentou argumentar que se tratava apenas de um fenómeno físico, provocado pelo reflexo da luz. Enfurecida, a multidão voltou-se contra ele e espancou-o até à morte.
Foi o início de três dias de matança pela cidade de Lisboa. Reza a história que os frades dominicanos clamavam contra os judeus e incitavam o povo a matar os “hereges”. Muita gente tinha já saído da cidade por causa da peste, mas os que ficaram, aos quais se juntaram muitos marinheiros de passagem – “de naus vindas da Holanda, Zelândia, Alemanha e outras paragens”, escreveu Damião de Góis -, não pouparam os judeus que se lhes atravessaram pelo caminho. Homens, mulheres e crianças foram torturados, massacrados e queimados em fogueiras, muitas delas ali mesmo junto à Igreja de São Domingos. Terão morrido entre 2 mil e 4 mil judeus.
Conta Damião de Góis: “E, por já nas ruas não acharem cristãos-novos, foram assaltar as casas onde viviam e arrastavam-nos para as ruas, com os filhos, mulheres e filhas, e lançavam-nos de mistura, vivos e mortos, nas fogueiras, sem piedade.”
25 anos depois, em 1531, um terrível terremoto danificou a igreja que foi restaurada. Em 1755 o grande terremoto de Lisboa danificou a igreja mais uma vez e duramente. E não foi a ultima tragédia. Um incendio ocorreu a 13 de Agosto de 1959.
Quando a igreja foi reconstruída (reabriu em 1994), decidiu-se deixar as marcas do que tinha acontecido. Hoje as paredes queimadas nos fazem lembrar é a história do massacre de 1506 – como se ainda ecoassem as palavras de ódio dos frades dominicanos e o som da multidão enfurecida, e os gritos dos judeus.